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Cadeia produtiva do leite com o teto na cabeça
Descubra as oportunidades para a produção de leite no Brasil, focando em tecnologia, eficiência, autossuficiência e a expansão para mercados internacionais.
Participando do V Leite Oeste Bahia, em Luiz Eduardo Magalhães – BA, tive a oportunidade de conversar com vários especialistas de diversas áreas afeitas à produção de leite. Dessas conversas ficou evidente que há vários Brasis e, em cada um deles, vários sistemas de produção. Assim, temos uma matriz produtiva que pode ser encontrada nos quatro cantos desse país, com enorme diversidade.

Podemos separar estados que não possuem capacidade de suprir a demanda interna e aqueles que tem superávit, ou seja, produzem mais do que o seu mercado consome. Os superavitários enviam esses produtos para os outros estados, já que as exportações brasileiras estão esbarrando na baixa capacidade competitiva existente.

Os estados do Sul e alguns do Sudeste, a exemplo de Minas Gerais, o maior produtor, suprem, em parte, a demanda dos estados importadores, a exemplo dos estados do Nordeste e Norte do país, além do maior consumidor de lácteos: o Estado de São Paulo. Esse também é o caso da Bahia que importa quase 50% de produtos lácteos que consome.

Por ser importador de outros estados, a Bahia poderia aumentar a produção e suprir a demanda em seu próprio território com a vantagem da regionalização de produtos e da logística. Assim, os estados deficitários poderiam expandir sua produção sabendo que há mercado consumidor para seus produtos.

Por outro lado, para os estados superavitários, o aumento da produção pode requerer aumento da demanda local ou de outros estados para absorver esse superávit, o que parece bem difícil. Isto por que o consumo de lácteos no Brasil está estagnado desde 2012, conforme Figura 1. Isto implica afirmar que caso não haja aumento de consumo, para cada aumento de produção pode implicar na necessidade de alguém diminuir a produção ou de deixar a atividade, para que haja acomodação da oferta em relação à demanda.

Figura 1. Consumo aparente per capita do leite e derivados no Brasil de 2000 a 2022 (litros/habitantes)
Consumo aparente per capita do leite e derivados no Brasil de 2000 a 2022 (litros/habitantes)
Ph.D Economia Rural – Embrapa Gado de Leite – [email protected]
Ph.D Economia Rural – Embrapa Gado de Leite – [email protected]
Esse movimento de saída de produtores fica evidente ao compararmos a redução da quantidade de produtores que venderam leite pelo censo de 2017 com o de 2006, que apresentou redução de 296,7 mil produtores, Figura 2.

Figura 2. Quantidade de produtores que venderam leite no Brasil (2017).
Gráfico de Quantidade de produtores que venderam leite no Brasil (2017).
Se o consumo interno está estagnado e a produção de leite também não cresce desde 2014, pode ser que tenhamos realmente atingido um teto na cadeia produtiva do leite no Brasil, Figura 3. Dessa forma, o aumento de produção por parte de alguns produtores mais tecnificados, pode significar a saída de outros, a exemplo da queda de 61% no número de produtores no Rio Grande do Sul de 2015 a 2022.

Figura 3. Produção de leite no Brasil (2000 a 2022).
Produção de leite no Brasil (2000 a 2022)
Além da estagnação da produção, as importações tiveram um aumento muito expressivo, apertando ainda mais o teto para a produção brasileira, já que o movimento é de substituição da produção doméstica com o produto importado. Essas importações são fruto da maior competitividade relativa dos vizinhos do Mercosul em um cenário de queda dos preços internacionais das principais commodities de lácteos, vis-à-vis os preços internos. A Figura 4 mostra a diferença de preços para o leite em pó integral do atacado no Brasil e do Global Dairy Trade (GDT).

Figura 4. Preço do leite em pó integral no atacado brasileiro, no equivalente importado e GDT (R$/kg)
Além da estagnação da produção, as importações tiveram um aumento muito expressivo, apertando ainda mais o teto para a produção brasileira, já que o movimento é de substituição da produção doméstica com o produto importado. Essas importações são fruto da maior competitividade relativa dos vizinhos do Mercosul em um cenário de queda dos preços internacionais das principais commodities de lácteos, vis-à-vis os preços internos. A Figura 4 mostra a diferença de preços para o leite em pó integral do atacado no Brasil e do Global Dairy Trade (GDT). Figura 4. Preço do leite em pó integral no atacado brasileiro, no equivalente importado e GDT (R$/kg)
Se a estagnação da demanda está impondo um teto que não se expande por conta da renda das famílias, e parte substantiva do mercado nacional está sendo suprida com importações mais baratas, a única possível saída será a de aumentar substantivamente a competitividade de nossa produção para estancar a perda de mercado advinda das importações e ou aumentar nossas exportações, “importando” a demanda de outros países.

Em outras palavras, precisamos competir internacionalmente para barrar as importações e ainda exportar nossos excedentes para dinamizar a cadeia produtiva do leite, a exemplo do caminho seguido por outras commodities agrícolas como milho, soja, café, laranja, carne bovina, suína e de frango, entre outras. Mas será que a cadeia produtiva do leite tem condição de trilhar esse caminho? A resposta é um sonoro SIM.

Isto porque o Brasil tem terras disponíveis, água em abundância, tecnologia de produção dominada, diversificada e adaptada a diversas condições edafoclimáticas, além de ser altamente eficiente e competitivo na produção de milho e soja, insumos relevantes para a produção de leite. Então o que faltaria para que se possa atingir autossuficiência, mesmo que relativa, e estacar a sangria da importação? A resposta está no aumento da competitividade em preços e qualidade.

Para tanto, é preciso aumentar a eficiência dos fatores de produção (terra, capital – vacas e mão-de-obra), reduzir os custos logísticos, por meio da otimização da captação do leite, melhorar a qualidade da matéria prima e dos processos fabris, aumentar a escala ao longo da cadeia, reduzindo a ociosidade das plantas processadoras e melhorar a governança da cadeia produtiva por meio da fidelização recíproca entre produtores, cooperativas e indústrias.

A tarefa é árdua, mas o mercado está se movendo rapidamente por meio de ajustes entre a oferta e a demanda. O vetor resultante das forças de mercado imporá restrições de sobre vida a quem insistir na ineficiência, seja dentro e ou fora da porteira.
José Luiz Bellini Leite
Lorildo Aldo Stock